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Partir de um lugar a outro: a busca por uma comunidade de ofício.

Muita gente viaja a São Paulo, para participar da MEGA Feira de Hobbismo. O evento, agora em sua quinta edição, já conquistou um lugar no coração de quem é apaixonado pelos fazeres da madeira. Também pudera, há muito necessitávamos de um lugar de encontro e trocas como a MEGA Feira.


Na oficina com Peter Ross
Na oficina com Peter Ross

Vou tentar tematizar a relevância das viagens e seu lugar na vida de quem se dedica a um fazer, nos dias de hoje.

Uma ajudinha do Chris Schwarz no curso de cadeira
Uma ajudinha do Chris Schwarz no curso de cadeira

Por que ir de um lugar a outro, se hoje temos tudo “à mão”? Sabemos das facilidades que algumas tecnologias nos proporcionam, deixando o que antes era escasso e difícil, prontamente acessível. Um livro que exigia um empréstimo entre bibliotecas (e uma vinculação institucional), hoje pode ser baixado em formato PDF; determinada técnica que antes era guardada em segredo, hoje se encontra descrita num artigo de revista (que também pode ser baixada em PDF); um encontro que dependia de intensa divulgação via materiais impressos (cartas, cartazes, folhetos, etc.), hoje alcança uma divulgação inimaginável através das redes sociais. Ainda assim, nos deslocamos à custa de grande esforço pessoal e financeiro, para estarmos juntos por alguns dias. Qual o sentido disso?

Na oficina com Chris Buchanan
Na oficina com Chris Buchanan
Na oficina com Chris Buchanan
Na oficina com Chris Buchanan

Se é certo que a informação hoje circula com mais facilidade, o mesmo não pode ser dito sobre a experiência. E esse é, a meu juízo, justamente o aspecto mais central do ofício: a vivência compartilhada, acontecimento cuja temporalidade tem a medida humana e que demanda presença autêntica. Tomo um minuto para compartilhar algo pessoal: em 2023, ganhei uma bolsa (de estudos) para fazer um curso de cadeira com Christopher Schwarz, na Lost Art Press, no Kentucky, EUA. Até aquele momento, Chris já havia publicado pelo menos dois livros sobre o tipo de cadeira que fizemos no curso. Já havia filmado alguns vídeos. Outras publicações também estavam disponíveis, ou seja, informação não faltava. Eu já trabalhava com madeira há duas décadas e tinha superado as dificuldades mais embaraçosas do métier (não todas, evidente), reunindo capacidade técnica e confiança para conseguir encarar um projeto assim sozinho. Corrijo o que disse: sozinho não, pois o Chris já havia compartilhado com o mundo o que sabia sobre as cadeiras, nos livros que escreveu. Mas por que então, me dispus a destinar tempo e uma boa quantidade de dinheiro para ir até onde Judas tinha conhecido o bourbon (antes de perder as botas)?

Vista da minha bancada no curso com Christopher Schwarz
Vista da minha bancada no curso com Christopher Schwarz

É evidente que conhecer uma espécie de ídolo pessoal entrou no jogo, afinal, boa parte do que vislumbramos atualmente no horizonte é baseado no narcisismo. Mas há algo além disso: poder ver alguém de perto, observar os movimentos corporais, ver suas obras com os olhos e com as mãos (e com o traseiro também, no caso particular das cadeiras), perceber a atmosfera especial de uma oficina, tendo a chance de ouvir o som produzido pelas ferramentas, ter até a chance de usá-las, tudo isso tem um valor constitutivo. É a presença do outro, ainda que imaginada, o que nos faz artesãs e artesãos. Simbolicamente, aprender de alguém, trabalhando ombro a ombro, institui um lugar e nos permite sentir o pertencimento a uma realidade compartilhada. Acreditem ou não, estamos todos na mesma.

Às vezes esse deslocar-se ganha uma mãozinha, já que podemos encontrar colegas de outros lugares que vêm até nós. Na MEGA Feira deste ano, além de pessoas de todo o Brasil, alguns colegas argentinos comparecerão, estreitando os laços de cooperação e amizade com nossos vizinhos. Entre eles estará Hernán Costa, que dará uma palestra no domingo sobre as plainas tradicionais de madeira, além de um curso na Forjaria Escola ensinando a construí-las, logo após a MEGA Feira. Entre os deslocamentos e a paixão pelos fazeres, esperamos continuar essa conversa com todo mundo por lá.


Tomando uma com Roy Underhill
Tomando uma com Roy Underhill
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Thiago Endrigo


Coordenador do Saber com as Mãos, dedicado à pesquisa, valorização e difusão dos fazeres tradicionais.



Esse artigo foi publicado na 3ª edição da Revista da MEGA Feira de Hobbismo

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